Egito: O trekking de Moisés pelo Monte Sinai

O lendário caminho bíblico dos 10 mandamentos


Planejei descansar a carcaça durante dois dias em Sharm el-Sheikh depois de passar 11 dias explorando o sul do Egito. Após os dias de descanso eu já estaria em condições de fazer um trekking ao Monte Sinai, além de economizar a hospedagem deste dia. Acordei tranquilo, tomei café da manhã e saí andando pelo calçadão do litoral de Naama Bay. Durante a caminhada, percebi que havia quiosques de agências de turismo oferecendo passeios diversos pelo Sinal. Parei no quiosque da agência Desert Rose Express para me informar sobre a subida ao Monte Sinai e recebi uma notícia que acabaria com o descanso e me faria mudar de planos.


COMO SUBIR O MONTE SINAI?

Para fazer o trekking ao Monte Sinai é necessário contratar uma agência de turismo em Sharm el-Sheikh ou Dahab. A subida a pé deve iniciar por volta de 2h30 da manhã, ainda escuro, para se chegar no topo do monte no horário do nascer do sol, tradicionalmente seria o horário em que Deus entregou as placas dos 10 mandamentos para Moisés.

Chegada dos ônibus e vans no local da subida


Uma informação importante que descobri na hora e me fez mudar o planejamento: o Monte Sinai fica numa área de preservação de responsabilidade do Monastério de Santa Catarina que está fechado todas as sextas e domingos. Isso quer dizer que não há tour iniciando às quintas e sábados pela noite. Os meus dias de descanso foram adiados e fechei com a agência para iniciar na noite do meu primeiro dia em Sharm el-Sheikh, pagando 200 EGP pelo tour completo.


PARTIDA PARA O MONTE

Partindo de Sharm el-Sheikh, a van da agência me buscou às 20h50 na recepção do hotel em Naama Bay, depois passou em hotéis pelo caminho catando outros clientes. São 211 km de percurso, passando por Dahab, até chegar em Santa Catarina. Como essa área possui a possibilidade de atuação de grupos terroristas, o comboio das agências segue escoltado pelo exército egípcio. Foram quatro paradas pelo caminho em postos de controle militar, no primeiro checaram os passaportes (obrigatório levar) e no último até cães farejadores foram usados.

Parada numa lojinha de artigos religiosos e lembranças do monastério


Ao chegar, as agências fazem uma parada rápida na loja do monastério para quem deseja levar alguma lembrança. Não é permitido fotografar dentro. Do lado de fora, vendedores ambulantes oferecem ponchos (U$ 10), dizendo aos turistas que lá em cima faz frio. Então, fica a dica: apesar do calor do Sinai, lá em cima faz frio e venta, sendo recomendado levar um casaco e capuz/toca.


NA TRILHA DOS 10 MANDAMENTOS 

Antes de iniciar a trilha, cada agência reúne seu grupo para apresentar ao guia de procedência beduína. Os beduínos são povos árabes que vivem de forma nômade no deserto. O guia fez um briefing da caminhada e a agência disponibilizou lanternas (também levei por precaução). O ponto de partida possui banheiros disponíveis (por 2 EGP).

Às 2h30 da manhã inicia a caminhada


A subida pode ser feita de "camelo-táxi" que custam em média 150 EGP (agosto 2014). Os condutores dos camelos são bem espertos, posicionam os animais em locais onde a subida é íngreme, para as pessoas mais sedentárias se entregarem de vez. Por curiosidade eu perguntei quanto custa um camelo daqueles: 5.000 EGP um baratinho.

Existe a opção de subir de camelo-táxi


Meu grupo era composto por 8 russos e 2 paquistaneses. Mais tarde conversando, descobri que os paquistaneses eram militares cumprindo missão de paz da ONU no Congo. Estavam de folga (leaving) e resolveram visitar o Sinai.

Galera do grupo na parada para descanso


No horizonte distante, as luzes da manhã começam a surgir e se encontram com a lua


No caminho da trilha existe casas de beduínos que aproveitam o movimento e fazem um "puxadinho" no estilo coffee shop para vender alimentos e bebidas para os trilheiros. É lógico que o preço é mais alto do que na cidade. Algo que me surpreendeu foi encontrar bandeiras do Brasil fixadas nesses estabelecimentos, provavelmente de brasileiros que passaram por ali e deixaram a marca desse país amado no mundo todo.

Mesmo no longínquo Monte Sinai o Brasil está presente...


... e não somente em uma, mas em várias casas de beduínos


No final da trilha se chega numa escadaria feita de pedras que é o ultimo trecho ara se chegar no topo. Alguns vendedores ficam pelo local para oferecer o aluguel de cobertores. Isso mesmo, aluguel, que cobram 10 EGP.

A escada feita de pedras é a reta final para alcançar o topo


O TOPO DO MONTE DE MOISÉS

Cheguei lá em cima por volta das 7h00 e o céu já estava clareando. As pessoas já sentavam nas pedras a espera do nascer do sol. Me acomodei num lugar entre as pedras e cerca de 5 min depois já começava o espetáculo do sol. Se a história bíblica de Moisés realmente aconteceu, ele teria visto essa mesma paisagem bela há muito tempo atrás.

É como chegar num cinema e esperar o início da seção


O sol surge em meio às montanhas do oriente


É um nascer do sol digno de ser comparado com São Thomé das Letras-MG


A Bíblia hebraica cita em duas passagens a história dos 10 mandamentos (Êxodo 20: 1-17 e Deuteronômio 5: 4-21). Em ambas se afirma que Deus escreveu essas leis em duas tábuas de pedra que foram dadas a Moisés no Monte Sinai. Estudos recentes dizem ter encontrado traços de influência de leis e tratados hititas e mesopotâmicos, mas ninguém sabe ao certo quando e quem realmente os escreveu. Diferentes interpretações são feitas pelo grupos religiosos, como o judaísmo, o samaritano, o cristianismo nas diversas vertentes e até o islamismo aparece com sua versão .

Atualmente, peregrinos e turistas do mundo todo visitam o local


Esse aí acabou perdendo o show ...


O nome Monte Sinai é grego e também é conhecido Monte Horeb (hebraico) ou Jebel Musa (árabe), todos significam “Monte de Moisés”. No pico existe a pequena Capela da Santíssima Trindade, construída em 1934 sobre as ruínas de uma igreja do século 16, onde se crê que foi o local que Moisés recebeu as tábuas dos 10 mandamentos.

Capela construída no lugar em que teria sido entregue os 10 mandamentos


Lá bem no fundo estão as colinas de Golã e a Terra Prometida (Palestina)


ESCADARIA PARA O MONASTÉRIO

Depois de admirar a paisagem do lugar que foi palco da história de Moisés, chegou a hora da descida que pode ser feita com duas opções: a primeira é o mesmo caminho de ida, uma trilha mais longa, porém limpa e fácil de andar, e a segunda opção é o Caminho de Moisés, mais antigo, mais curto, mais difícil de se deslocar, porém a vantagem é que possui paisagens mais exóticas e incríveis.

750 degraus abaixo do topo seria onde Aarão e os 70 sábios esperaram enquanto Moisés recebia as tábuas


Os mantimentos dos beduínos é levado com a ajuda de burros


A descida acontece por entre paredões de pedras incríveis


O caminho recomendado na descida é o Caminho de Moisés, uma trilha que acontece por pedras dispostas em degraus, conhecida como Escadas do Arrependimento ou Escada dos 3 mil degraus (3.749 degraus!). É um antigo caminho de peregrinação que liga o monastério ao alto do Monte, melhor de fazer na descida, é claro. Ainda é possível observar ruínas antigas espalhadas pelo caminho.

Placas indicam a direção da escadaria de quase 4 mil degraus


O Monte Sinai é constituído de granito e possui 2.285 metros de altitude


O caminho possui várias construções antigas


Os degraus de pedra seguem por entre terraços de pedra


Vários peregrinos passaram por essas trilhas ao longo dos séculos


Apesar de ser uma montanha árida, as rochas criam um belo show de imagens


A trilha dos degraus passa pelas ruínas de uma antiga igreja dedicada ao personagem bíblico Elias que viveu no século 11 a.C. e viajou até o Monte Sinai se abrigando em uma caverna. Assim como aconteceu com Moisés, ele também presenciou o contato com Deus. Essa caverna fica logo no início da descida do pico, indicada pela placa "Elijah Basin". Elias é a única pessoa mencionada na Bíblia a retornar ao Monte Sinai depois que Moisés e sua geração haviam passado pelo lugar, muitos séculos antes.

A Igreja de Elias pode ser vista no caminho de retorno


Uma trilha inesquecível


MONASTÉRIO DE SANTA CATARINA

De longe vai surgindo entre as montanhas a silhueta do Monastério de Santa Catarina, o mosteiro cristão mais antigo ainda em funcionamento. É um monastério Ortodoxo Cristão, a mesma religião da maioria dos russos, sendo um local de importância para esses turistas. Dizem que o Corpo de Santa Catarina estaria guardado lá dentro em algum lugar.

O nome do monastério seria uma homenagem à Catarina de Alexandria que morreu decapitada


Segundo a lenda, o corpo de Catarina foi levado por anjos para o pico mais alto do Sinai


As muralhas foram construídas pelo imperador Justiniano I para proteger a igreja e os monges dos ataques de beduínos, os povos do deserto. Mas como um monastério cristão durou tanto tempo em meio a terras árabes? Pois bem, diz a lenda que o profeta Maomé teria visitado a região e foi bem recebido pelos monges ortodoxos, prometendo-lhes a sua proteção. Isso influenciou a conduta dos muçulmanos perante o mosteiro.

Dentro das muralhas foi construída uma mesquita nunca utilizada, pois não está corretamente orientada para Mecca


Não se pode entrar no monastério de bermuda ou saia curta, tendo que cobrir as pernas com um pano

Tudo começou com a Capela da Sarça Ardente, construída pela imperatriz Helena de Bizâncio, no século 4 d.C. Ali se acreditava estar a árvore de sarça em que Moisés teria tido o primeiro contato com Deus. "E apareceu-lhe o anjo do Senhor em uma chama de fogo do meio duma sarça; e olhou, e eis que a sarça ardia no fogo, e a sarça não se consumia. (Êxodo 1:2)... E disse: Não te chegues para cá; tira os sapatos de teus pés; porque o lugar em que tu estás é terra santa (Êxodo 1:5).

Esta é a suposta Sarça Ardente onde Moisés teria visto Deus pela primeira vez


O mosteiro possui a segunda maior coleção do mundo de iluminuras (pintura em pergaminho). A maior é a do Vaticano


Monges gregos da Igreja Ortodoxa comandam o monastério até hoje


Não é permitido tirar fotos no interior da igreja


Despedida do guia beduíno Mussah e do funcionário da agência


RETORNO

Ao terminar a visita ao monastério, todo o grupo embarcou na van e foi levado até um restaurante típico na estrada de volta. O café da manhã faz parte do pacote da agência de turismo, não é grande coisa, nem parecia estar dentro dos padrões de limpeza que estamos acostumados, mas valeu a pena para encerrar a aventura na terra dos descendentes dos beduínos.

Café da manhã depois das 10h00, antes de encarar a estrada de retorno a Sharm el-Sheikh


CHECK LIST

Não esqueça de levar: passaporte, casaco com capuz ou toca, lanterna, máquina fotográfica, 1 litro de água e um pouco de comida. Levar também dinheiro para a gorjeta do guia (opcional), que no meu caso foi 20 EGP (10%). Não esqueça que mesmo levando roupa de frio, o retorno acontece por volta das 11h00 quando o calor já está intenso, logo, é bom vestir roupas leves e frescas.


MEU ROTEIRO

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Roteiro completo: MISSÃO EGITO

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Comentários

  1. Muito bom.
    Dicas muito importantes.
    Obrigado.

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  2. Vou ir lá por estes dias, muito boa esta matéria sobre o lugar.
    Estou preparada para a subida.

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  3. Gostei das dicas, muito boa, estarei lá em setembro e estava com duvidas sobre o frio que dizem que faz lá em cima e do calor.

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  4. Muito bom seu compartilhamento da viagem. Mas fica minha duvida ao povo local responsável pelo turismo: o Monte Sinai é lugar santo e não deveria permitir pessoas calçadas.

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  5. obrigada por compartilhar sua experiencia, vou pra lá em abril22 e estou refletindo muito sobre o esforço sobrehumano que terei que fazer pra subida já que não sou jovem como vc kkk

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  6. Muito bom seu conteúdo! Já quero fazer tudo igual! Poderia por favor indicar a agência que você agendou esse passeio de subida ao Sinai?

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Sobre o autor

Sobre o autor
Renan é carioca, mochileiro, historiador e arqueólogo. Gosta de viajar, fazer trilhas, academia, ler sobre a história do mundo e os mistérios da arqueologia, sempre comparando os lados opostos de cada teoria. Cada viagem que faz é fruto de muito planejamento e busca conhecer o máximo de lugares possíveis no curto período que tem disponível. Acredita que a história foi e continua sendo distorcida para beneficiar alguns grupos, e somente explorando a verdade oculta no passado é que se consegue montar o quebra-cabeça do mundo.